sábado, 17 de maio de 2008

Internetês no ônibus

São Paulo costuma a ter os seus dias previsíveis. Mas graças a teimosia de quem é um pouco otimista, eu não conseguia saber do meu paradeiro à meia-hora futura dentro de um ônibus. Pensa-se no vento gelado que ninguém pode muito com uma gripe aflorada. Do vendaval que batia e gripado como estava, cuidei de fechar as janelas, guardando o vento do lado de fora.

Foi então no silêncio das janelas fechadas e dos passageiros vagando em outro mundo, que uma conversa de fundo ganhou corpo. Era motorista e cobrador, atentos, com sede de voz:

- Mai Zé, rapai, eu num pensava que esses negócio de computadô ia tão longe assim não!


- Arre! Ô Jão, tá tudo em conté canto! Açogue, padaria, farmácia...pode olha nas faxada aí...

- É que eu tô abismado memo é com meu muleque, pricisa vê Zé, o danado acha tudo naquela coisa.

- Acha tudo? Tem o mapa das rua toda? Pode sê também dos programa que tem dentro dele.

- Não é só de rua não! Ele escreve futebol e aparece o que ele quisé de bola, time, classificação. Esse domingo memo comemo uma dobradinha, e num é que o muleque me tira a receita do computadô?! Ele diz que é um tal de Gúgo.

- Vixi, mai que raio de Gúgo é esse Zé?

- É um negócio que você escreve e ele te dá o que você qué. Parece aqueles filme do gênio sabe? Tá doido rapai! Eu nunca vi isso! Se tu escreve 51 lá, ele vai te dizê o que é. Daqui a poco eu vô no bar com a patroa e vô te que escreve nesse Gúgo também.

- É rapai, tá tudo mudano. Meu moleque vê isso todo dia na escola. Otro dia ele chegou em casa pedino pra eu compra uma web-cam pra ele.

- Bi-cama? O que tem bi-cama Zé?

- Eita cabra! É web-cam, dessas câmera que computadô tem. É como se fosse um telefone que da pra vê a pessoa.

- Vixi, mai dessa bi-câmera eu não sabia também. Esse mundo vai longe Zé! Eu to loco pra aprende esse negócio. Vô vê se entro nessas escola da prefeitura, o mai rápido que eu pudé.

-Óia aí Zé, já tem uma aí na esquina, anota o número!

- Mai é já. Se não rapai, o filho vai acaba dando aula no pai!


E a conversa fugiu, entrou a do trânsito. Na do trânsito, o ouvido cá já voava, queria guardar sons para transcrever, o mínimo que fosse, o mínimo que aqui coube, o mínimo que convém lembrar. Penso no meu filho, que pode vir a falar um bom chinês, manobrando máquinas que fogem aos meus costumes de tantos anos. O mundo é grande, porém para nós cabe em alguns anos. O Brasil é grande, porém pode caber um ônibus. O único certo memo é o Jão, o mundo vai longe, e de qualquer maneira, nós é que vamos ficando.

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